
As descobertas sobre a eficácia inédita do medicamento lenacapavir para a prevenção do HIV trouxeram esperança sobre a erradicação de novos casos da doença que tem feito vítimas globalmente há 50 anos.
As injeções de uso semestral demonstraram eficácia igual ou superior aos 99% dos comprimidos diários atualmente usados como profilaxia pré-exposição (PrEP), incentivando a Organização Mundial da Saúde (OMS) a recomendar, na última segunda-feira (14/7), o uso do medicamento.
O problema desta nova esperança da medicina, porém, está nos custos que ela acarreta e boa parte deles são dispensáveis. Uma análise publicada em formato preprint na revista The Lancet, feita por pesquisadores que trabalham há décadas com o acesso aos remédios do HIV, indica que o tratamento poderia ser 1.000% mais barato do que o preço cobrado atualmente.
O que é o HIV e sua diferença para a aids?
- O vírus da imunodeficiência humana (HIV) é um microrganismo que ataca o sistema imunológico. Quando não é tratado, ele pode evoluir para a aids (síndrome da imunodeficiência adquirida), que representa o estágio mais avançado da infecção pelo HIV.
- Embora não exista a cura para a aids, o tratamento antirretroviral pode controlar a infecção, permitindo que pessoas vivendo com HIV tenham uma vida longa e saudável.
- O tratamento correto pode fazer com que o paciente atinja a carga viral indetectável para o HIV, ou seja, tão baixa que não pode ser detectada por testes padrão. Nesse caso, a pessoa também não transmite o vírus.
- O HIV é transmitido principalmente através de fluidos corporais específicos, durante o sexo sem proteção, compartilhamento de seringas e de mãe para filho durante o parto, quando não for bem assistido.
- Beijos, suor, ou qualquer outra forma de contato íntimo, incluindo o sexo feito com preservativo, não transmite o HIV.
- O SUS disponibiliza testes rápidos para o HIV e também o tratamento preventivo com a profilaxia pré-exposição (PrEP), com o uso de um remédio diário. Procure um serviço de saúde e informe-se para saber se você tem indicação para PrEP.
Segundo o grupo de pesquisadores liderado pelo médico ativista Andrew Hill, pesquisador da Universidade de Liverpool, as duas doses necessárias para o tratamento com lenacapavir em um ano poderiam custar apenas US$ 25 (aproximadamente R$ 139). O custo anual do medicamento por pessoa, porém, é de cerca de US$ 24,9 mil (R$ 138 mil).
“Estamos em um momento em que poderemos ver a eliminação virtual das infecções por HIV, mas somente se o medicamento for acessível e amplamente disponível”, disse Andrew Hill em entrevista ao European Aids Treatment Group.
O que é o lenacapavir?
A substância tem eficácia comprovada para reduzir a quase a zero a transmissão do vírus, além de atuar também para pessoas com HIV avançado. A injeção não é uma vacina contra o HIV. Ela é apenas um remédio antirretroviral para prevenir que o vírus se instale no organismo em caso de contato, de forma semelhante aos comprimidos da PrEP, que são tomados diariamente.
Sua vantagem está no fato de poder ser aplicado fora de ambientes hospitalares, em farmácias, por exemplo, e só duas vezes ao ano. Testes mais recentes feitos com a medicação indicaram que apenas uma dose já pode servir de proteção para o ano todo, mas em aplicações de injeções mais profundas, em um protocolo hospitalar que ainda está sendo estudado.
Entretanto, os especialistas alertam que o preço atualmente cobrado pela farmacêutica que possui a patente, a Gilead, ainda impede o uso em larga escala.
Para estimar a redução de custos que seria possível alcançar com o tratamento, os pesquisadores imaginaram uma produção em grande escala e caso se retirassem valores vinculados à patente, com capacidade de produção para atender mais de 5 milhões de pessoas.
Em resposta às críticas sobre os custos, a Gilead concedeu licenças voluntárias para três fabricantes de genéricos investirem na produção de produtos derivados do lenacapavir em países de baixa renda, especialmente na África.
Por isso, os pesquisadores defendem que os governos avaliem o uso de licenças compulsórias para produzir os medicamentos patenteados sem respeitar as exigências dos organismos internacionais.
“Os medicamentos preventivos devem ter preços que alcancem o maior número possível de pessoas. Eles não podem ser tratados como terapias de luxo. É absolutamente insano o valor pedido: nenhum sistema de saúde pode arcar com a implementação generalizada do lenacapavir aos preços atuais”, enfatizou o epidemiologista Andrew Grulich.
Hill arremata: “O lenacapavir é o mais próximo que temos de uma vacina contra o HIV. Mas, sem acesso acessível, esse avanço corre o risco de se tornar uma tragédia para a saúde pública, em vez de um triunfo”, conclui.
Bruno Bucis / metropoles.com
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